Artur Salles Lisboa de Oliveira é administrador de empresas e colunista da Revista Exame
Especial para o Blog do Ronaldo Cesar
A Copa do Mundo, como qualquer outro evento, vem e vai embora, deixando apenas lembranças, frustrações e registros estatísticos para os especialistas e curiosos. Independente do resultado final, Brasil vencedor ou não, o dia seguinte à final é a única certeza que todos nós temos: trabalho duro para pagar o plano de saúde da família. Aqueles poucos privilegiados que estão podendo passear pela belíssima Veneza ou desfrutar de outros destinos internacionais representam uma pequena minoria.
Algo que realmente não compreendo é a insistência da mídia em tornar o Mundial no Brasil mais atrativo mediante a bajulação do jogador Neymar, sem dúvida um bom jogador. Por qual razão os jornalistas insistem em utilizar adjetivos como craque, fenômeno, talento, gênio em quaisquer jogadas do atleta mencionado? Se um outro integrante da seleção brasileira fizer algo similar – idêntico, em certos casos -, o lance é meramente normal. A imprensa, literalmente, constrói o ídolo, suga os frutos da sua fama e afronta a inteligência dos brasileiros.
Convenhamos: o futebol está suficientemente enraizado na cultura popular brasileira para que a Copa do Mundo seja um sucesso para todos. Os jogadores terão, de acordo com suas performances individuais, seus passes valorizados; a poderosa organizadora encherá seus bolsos com patrocínios e outros tipos de contratos; a mídia mundial exporá seus anunciantes com a atenção de bilhões de pessoas aos jogos; por fim, os brasileiros terão seus momentos de patriotismo ao celebrarem enfaticamente os resultados da seleção nacional. Se tudo está garantido, por qual razão bajular?
A imprensa nacional carrega o complexo de terceiro-mundismo, que muitos brasileiros também possuem. Por mais que sejamos vitoriosos em outras modalidades – como o vôlei -, o futebol é a única ferramenta de afirmação nacional devido à sua ampla penetração social. Vencer no futebol – especialmente sediando o Mundial -, é algo necessário para o eterno gigante adormecido que ainda persegue uma identidade. A bajulação midiática reflete, mediante os exageros “fenomenal-brilhante-genial” Neymar, a auto-afirmação do povo brasileiro.
E como não somos capazes de sermos grandes como povo, precisamos de ídolos “espetaculares-geniais-galácticos” para que alcancemos a nossa afirmação perante nós mesmos e o Mundo ao empurrarmos uma bola para dentro de um gol. Caso os “poderes sobrenaturais” de Neymar não sejam capazes de fazer a seleção brasileira vencer, um pouco desse sonho de ser “gente grande” um dia será roubado dos brasileiros. Continuaremos apequenados e sem o nosso principal “brinquedo”: a bola de ouro.