Político arguto, Fernando Lyra era um estrategista de visão privilegiada da cena, dos acontecimentos e das pessoas. E entre os seus “achados” está o lançamento para a política da ex-deputada Cristina Tavares, uma das mais combativas figuras de Pernambuco e, até 2009, a única mulher a ocupar uma cadeira na Câmara dos Deputados.
A “invenção” de Lyra, como a própria Cristina costumava falar, ocorreu em 1978, nos estertores da ditadura e às portas da campanha pela Anistia Ampla Geral e Irrestrita. Era ano de eleição e Lyra – deputado e uma das estrelas do “Grupo Autêntico” do MDB – estava internado se recuperando de um infarto, quanto recebeu a visita da jornalista, de quem era amigo e de certa forma conselheiro.
“Dei-lhe corda para que saísse candidata, embora ela não tivesse dinheiro nem votos. Daríamos um jeito, prometi. Ela saiu do quarto decidida”, contou Fernando Lyra à jornalista Tereza Cruvinel, quando da reedição do livro “Perfil Parlamentar – Cristina Tavares” (Câmara dos Deputados, 2004). “Ela prometia ser uma deputada excepcional, tinha tudo para ser uma grande companheira da resistência democrática. Não me enganei”, completaria.
Polêmica, destemida e com trânsito fácil no meio político de oposição ao regime militar, Maria Cristina Tavares Correia começou a tomar gosto pela militância política em 1976, quando percorreu todo o País acompanhando o deputado Ulysses Guimarães como setorista do MDB (Movimento Democrático Brasileiro) no Jornal do Brasil. Este trabalho já havia rendido à repórter a amizade e o respeito de nomes importantes da resistência democrática como Franco Montoro, Paulo Brossard e Tancredo Neves, entre os políticos nacionais, além dos pernambucanos como Jarbas Vasconcelos, Thales Ramalho e o próprio Fernando Lyra.
A viagem com Ulysses terminou quando a comitiva chegou a Pernambuco, mais propriamente a Olinda, onde era candidato a prefeito o professor Germano Coelho, ex-coordenador do Movimento de Cultura Popular (MCP), durante o primeiro governo de Miguel Arraes, o que foi interrompido pelo golpe militar. Cristina pediu demissão do JB e engajou-se na campanha de Coelho, de quem era amigo. A partir daí, praticamente largou a carreira jornalística, exercida vez por outra, mas como free lancer.
Após a intervenção de Fernando Lyra, Cristina Tavares lançou sua candidatura a deputada federal, mesmo sem nunca ter passado por nenhuma experiência parlamentar. Como o amigo Jarbas Vasconcelos saiu candidato ao Senado, algumas de suas bases eleitorais na capital e na sua cidade, Nazaré da Mata, foram abertas para Cristina, que foi eleita com 22.519 votos, em uma campanha memorável que envolveria ainda a ala progressista da Igreja Católica e o próprio arcebispo dom Helder Câmara. Lyra também seria eleito (e bem eleito) com grande votação em todo o Estado, sobretudo no Agreste.
Ao longo do tempo, Cristina consolidou uma das mais autênticas carreiras políticas surgidas no Estado. Com vitórias, como as reeleições de 1982 e 1986, esta para a Assembleia Nacional Constituinte. Com derrotas, como a eleição do Recife, em 1988, quando foi candidata a vice-prefeita, e em 1990, derrotada junto com vários dos antigos “autênticos” do PMDB. Morreu em 1992, após uma dura batalha contra o câncer. Mas fez história, como previu Fernando Lyra que, mais uma vez, estava certo.