As recentes pesquisas do Ibope (7-11/nov) e Datafolha (28-29/nov) apresentaram três traços comuns: (1) liderança folgada de Dilma Rousseff em intenções de voto, com perspectivas de ganhar o pleito no primeiro turno; (2) manutenção da aprovação de governo da presidente (40% de ótimo e bom na média dos dois levantamentos citados), e (3) cerca de dois em cada três eleitores querem mudanças na próxima administração presidencial (66% no Datafolha e 62% no Ibope).
Mas aí se estabelece um paradoxo entre (1) e (2) vis-à-vis (3): se os eleitores atribuem à presidente altas intenções de voto, e se avaliam sua gestão como positiva, como é que eles mesmos, majoritariamente, desejam que o próximo governo seja diferente do atual, quer dizer, querem outro governo?
Trata-se de um falso paradoxo.
(a) Neste estágio da pré-campanha, o governante leva extraordinária vantagem sobre seus potenciais adversários: o poder político, administrativo e financeiro da incumbência (disputa a eleição no cargo), alta exposição na mídia, recall, mistura de atos de governo com campanha velada, etc. Tudo isso pode influenciar, favoravelmente, as intenções de voto do mandatário e a avaliação de seu governo.
Os oponentes, carentes desses recursos, dispõem de apenas uma ferramenta: o discurso oposicionista. No caso da atual corrida presidencial há, ainda, em desfavor dos dois prováveis adversários da presidente, o fato de que eles são pouco conhecidos dos eleitores.
Com efeito, nesta pesquisa do Datafolha, o grau de desconhecimento (os eleitores não conhecem o candidato ou apenas ouviram falar dele) de Aécio Neves é de 60%, e o de Eduardo Campos é de 73%. Dilma tem um grau de desconhecimento de apenas 10%. Em eleição existe uma regra determinística: o eleitor não vota em quem não conhece.
(b) A avaliação de governo é considerada pelos especialistas um dos principais fatores determinantes do voto: governos bem avaliados têm maior probabilidade de reeleger governantes ou candidatos apoiados por eles.
O governo de Dilma é bem avaliado? É, mas não em relação ao que já foi (65% de ótimo e bom em março deste ano), embora se detecte gradual recuperação. De qualquer sorte, nas 10 pesquisas nacionais publicadas depois dos protestos de junho a média de aprovação da gestão da presidente é de 38%, índice que leva cartão amarelo para quem pleiteia novo mandato.
(c) O deslocamento das intenções de voto e da avaliação do governo, dos ventos que sopram a favor das mudanças, fica evidente na constatação de que, mesmo entre os eleitores que expressam intenção de votar em Dilma e entre os que aprovam seu governo, há grande contingente querendo uma administração diferente no futuro próximo.
De fato, segundo o Datafolha, no cenário mais provável com Aécio e Eduardo, Dilma pontua 47% de intenção de votos. Entre seus eleitores, 45% desejam mudanças na gestão. E dentre os 41% que aprovam o governo da presidente, o mesmo percentual prefere que as ações do próximo mandatário sejam diferentes. Registre-se, de passagem, que no rol dos 40% dos eleitores que consideram a administração da presidente apenas regular, 80% afirmam querer mudanças.
Enfim, o sentimento de mudança, embalado pelas manifestações de junho, coabita, sem contradições, com os números que as pesquisas desfilam no período atual da pré-campanha eleitoral, a quase um ano do pleito. No estágio de agora, as intenções de voto ainda são muito voláteis e guardam distância regulamentar das decisões de voto.
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Maurício Costa Romão, Ph.D. em economia, é consultor da Contexto Estratégias Política e Institucional, e do Instituto de Pesquisa Maurício de Nassau. mauricio-romao@uol.com.br. http://mauricioromao.blog.br.