Ele chegou ao mais alto cargo da República através do tumultuado e traumático processo de impeachment da então presidente Dilma Rousseff, envolvida em escândalos de corrupção e obstrução da justiça, a quem sucedeu cumprindo mandamento constitucional. Prometeu erigir uma "Ponte para o Futuro", plano de governo bem formulado que atendia aos reclamos da nossa nação, mergulhada em gravíssima crise econômica que jogou na rua do desemprego cerca de 14 milhões de brasileiros.
Confesso que acreditei que o professor de Direito Constitucional Michel Temer, reunia, como poucos, as qualidades adequadas para o grande desafio de realizar, em tão graves circunstâncias, uma transição para um novo Brasil. Afinal, além de se tratar de um ex-presidente da Câmara, Temer presidiu o PMDB, legenda que congrega parte do que há de melhor e pior no cenário político do país, tarefa para político experiente e desenvolto.
No entanto, a desenvoltura do diálogo do Presidente da República com um conhecido e delinqüente mega-empresário, em encontro na calada da noite, revelou relação promiscua ou mesmo criminosa. O caráter clandestino da gravação, cujos trechos fundamentais já foram atestados por diversos peritos, se equipara à forma furtiva do acesso do meliante ao Palácio do Jaburu, sem registro em agenda oficial ou identificação na portaria. E o silêncio do Presidente, ao não reportar às autoridades competentes o teor das graves afirmações de seu interlocutor, em flagrante prevaricação, só não é mais eloquente que suas suspeitas assertivas, capturadas no áudio.
Os reclamos por perícias técnicas e exame de legalidade da prova, após o conteúdo da gravação ser divulgado e em nenhum momento negado pelo Presidente da República, mais parece o apelo de um moribundo por algumas horas mais de vida.É certo dizer que Temer vinha fazendo um grande trabalho, ao propor e até realizar reformas que há anos seus antecessores negligenciaram, mas isso não confere imunidade para que o presidente pratique crimes de responsabilidade.
Nenhuma ponte pode ser construída sobre alicerces corrompidos. E é por isso que a OAB, honrando a tradição de sempre vocalizar os anseios da sociedade civil, em defesa da ordem jurídico-constitucional, se reuniu em caráter extraordinário no último sábado deliberando pela proposição de pedido de "impeachment" do Presidente da República Michel Temer, medida extrema e amarga e que se repete pela terceira vez após a promulgação da Constituição Federal de 1988. Erigida sobre o lamaçal que invadiu o cenário político da nação, a ponte de Temer ruiu.